sábado, 1 de dezembro de 2007

O Menino do Bando

Alessandro Barreiras, Gabriel Soares, Jaqueline Morais, Renata Souza e Silas Barbosa, do Virajovem Rio de Janeiro (RJ)* (29/11/2007)




Lázaro Ramos em ´O Homem Que Copiava`

Ele já foi parado com arma na cabeça pela polícia। Já foi abordado enquanto sacava dinheiro no caixa 24 horas. Também já foi seguido por seguranças no supermercado. Esses acontecimentos fazem parte do dia-a-dia de muitos jovens negros no Brasil, e não é diferente com o ator baiano Lázaro Ramos. Ele recebeu o Virajovem do Rio de Janeiro em seu apartamento para bater um papo sobre a discriminação que ainda persiste em nossa sociedade. "Tem uma lei que nos protege e sempre que a gente se sentir menosprezado tem que fazer uso dela", avisa o ator.


Por que escolheu a carreira de ator?Comecei a fazer teatro com 10 anos de idade e nunca tinha assistido a uma peça de teatro porque na minha família não tinha a cultura de levar os filhos para o teatro e também não tinha dinheiro pra comprar o ingresso। Mas no colégio, quando tinha prova, eu sempre propunha fazer uma peça ao invés de fazer a prova। Eu era um pouco tímido e era a maneira que tinha de me comunicar। Na verdade, comecei a fazer teatro para poder conseguir me comunicar com as pessoas. Eu não conseguia dizer as coisas dentro de casa, não conseguia dizer para o meu pai que o amava. E, quando fazia teatro, conseguia falar tudo o que queria, mas fingindo que era outra pessoa. Fiquei nessa de 10 anos de idade até uns 15 anos, só que nesse período minha mãe adoeceu e eu precisava ganhar grana imediatamente. Então, fui estudar Patologia, em paralelo com o teatro, porque também no colégio onde eu estudava tinha um curso de teatro e só poderia freqüentar quem estudasse lá ou fizesse algum curso. Lá tinha o curso de Desenho Industrial ou Patologia Clínica. Como eu não sabia desenhar nem uma letra, resolvi fazer Patologia.

Nessa perspectiva, do acesso ao conhecimento, o que você acha da política de cotas?Sou a favor. Não acho que seja a medida ideal, porque o bacana seria que o País tivesse a capacidade, a inteligência, de incluir todos seus habitantes. Não falo somente de negros, falo de negros, brancos, mulheres, índios, eu acho que esse seria o País legal se tivesse essa capacidade. Que a gente não precisasse de uma lei que impusesse que uma instituição de educação incluísse outras pessoas pra tornar essa universidade mais diversa, com mais talentos que possam ser potencializados. Eu sou fruto de cota e, por isso, eu tenho que ser a favor de cota, porque antes fazia teatro no colégio e não tinha mercado de trabalho, não tinha onde aprender, não tinha dinheiro para me inscrever em uma faculdade e poder executar uma outra profissão que me desse dinheiro, como foi a Patologia Clínica. Eu precisei do Bando de Teatro Olodum. Mas se não fosse esse grupo, talvez, eu ainda estivesse no hospital trabalhando como técnico de Patologia e não estaria entretendo as pessoas e levar as reflexões que eu levo.
O Joel Zito tem uma boa discussão sobre o negro nos meios de comunicação, como o negro é representado na televisão. Na história da televisão, o negro é sempre coadjuvante e intérprete de profissões subalternas. Isso vem mudando? Eu acho que sim. E isso é fruto de uma pressão que a sociedade vem fazendo há muito tempo. E a sociedade que falo é de movimentos negros, dos artistas negros que vêm reclamando. Tem uma frase ótima que Gilberto Gil disse: "O povo sabe o que quer, ele só não quer o que não sabe". Quando a televisão começou a colocar em Da cor do pecado, Cidade de Deus, Cidade dos homens, Cobras e Lagartos atores negros como protagonistas e começou a dar audiência, isso foi um depoimento que o público disse: eu quero ver essas pessoas, quero ver esses rostos, me identifico com isso. E televisão, não se enganem, é dinheiro, é audiência, ou seja, a televisão entendeu que pretinho dá dinheiro, dá audiência, então, vamos colocar eles um pouquinho mais.
Mas eles são sempre pobres!Eu acho que os caras não sabem lidar. Porque colocaram tão pouco e sempre na subalternidade ou na nulidade que agora que estão incluindo eles estão aprendendo. Eu acho que Duas Caras já é um aprendizado do Agnaldo Silva, porque ele deu um passo muito importante, incluiu vários negros, com família e com histórias importantes dentro da dramaturgia. Você já foi vitima de racismo tanto na vida artística como na cotidiana?Na minha vida cotidiana, muito. Já fui parado pela polícia com arma na cabeça. Abriram o meu carro e me perguntaram o que eu estava fazendo ali naquele carro. Já fui abordado pela polícia no banco 24 horas tirando dinheiro e o cara perguntou o que eu estava fazendo lá, eu falei: estou tirando dinheiro da minha conta, porque? E ele falou: porque você está aí tipo meio suspeito de boné. Já fui seguido por seguranças dentro de supermercado. No ambiente escolar você se sente meio diferenciado. Eu estudei em colégio particular, existiam pouquíssimos negros, na minha sala tínhamos eu e Marisa, dois somente. Na minha adolescência namorei muito pouco, estudei em colégio particular, onde a maioria era branca. E no campo afetivo era apenas o melhor amigo de muita gente, mas agora namorar mesmo nunca namorei. Fui namorar quando estudei em colégio público que tinha mais pessoas com a mente aberta. No campo profissional, eu me sinto um pouco protegido porque eu vim do Bando. E depois do filme Madame Satã, eu consegui um grande respeito. As pessoas começaram a me considerar um bom ator e investir em mim.
Sobre o filme Madame Satã, o modo de vida do negro brasileiro ainda permanece atualmente?Na época de Madame Satã não tinha a intromissão, a interferência tão grande do tráfico. Se Madame Satã vivesse hoje em dia, provavelmente, ele estivesse envolvido com o tráfico e acho que isso transforma as coisas brutalmente. Madame Satã tem uma característica que permanece ainda, assim como ele, eu conheço várias pessoas que são sobreviventes e que usam os poucos recursos que tem para sobreviver. No caso dele, um cara que saiu de Pernambuco e chegou ao Rio de Janeiro sem nada para fazer, só tinha um recurso, que era o seu corpo, que usou para sobreviver, ou lutando capoeira ou com a sexualidade. Ou acarinhando, cuidando de pessoas e agregando as prostitutas, e até mesmo adotando crianças. Ou seja, estava formando a família dele. Hoje em dia, tem muita gente que eu percebo que tem poucos recursos e que, ainda assim, sobrevivem e se solidarizam como outras pessoas. Nas comunidades, muitos se juntam para conquistar suas coisas. Esse aspecto é muito presente e positivo.
Você está no topo do artista negro no Brasil।

Como você se sente transmitindo através de seus personagens sua cultura, e até servindo de referência para as pessoas? Lá na Cidade de Deus todo mundo descoloriu o bigode por causa do Foguinho। É tudo o que eu sempre quis na minha vida। Sempre quis ser referência mesmo, porque senti muita falta disso quando eu era pequeno। Eu assistia a um filme e não achava com quem me identificar. Acho que é a realização de um sonho mesmo e fico mais feliz porque eu não precisei abrir mão de nada do que eu sou e do que eu acredito pra ser uma referência. Continuo falando as mesmas coisas que eu sempre falei desde o Bando de Teatro Olodum, continuo pensando as mesmas coisas que eu pensei, continuo me relacionando com as mesmas pessoas e procuro manter meu comportamento o mesmo de sempre. Procuro manter a humildade e apesar de ser um ator eu não sou melhor do que ninguém. Procuro utilizar os espaços que tenho na mídia ou dando entrevista, ou na televisão, ou nos papéis que eu escolho, para mandar mensagens e acho que eu sou um privilegiado por poder fazer isso. Sei de outras pessoas, que tem talento igual ao meu, e tem essa mesma vontade de ser referência e não consegue dar o pulo do gato, e eu sou feliz porque eu dei o pulo do canguru.
Você acha que o fato de estar trabalhando dessa forma, se tornando referência, contribui para que a sociedade veja o negro de outra maneira?Eu espero que veja. Não quero ser sempre a exceção, que todos os trabalhos sejam só de Lázaro Ramos. Eu quero que Sidney Sampaio protagonize vários filmes e novelas. Não quero ser único, o meu desejo é esse. Não quero ser uma ilha, mas um continente inteiro e tenham vários iguais a mim com as mesmas oportunidades.
Você tem alguma experiência com projetos sociais?Lá em Salvador eu sou parceiro de uma instituição chamada de Steve Biko, que é um pré-vestibular para afro-descendentes. Aqui, eu sou bastante ligado à Cufa (Central Única de favelas), porque a equipe do meu programa Espelho, que apresento e dirijo no Canal Brasil, é formada por alunos do curso áudio-visual da Cufa. Essa é a minha maior ligação. Os meninos chegaram com um gás e um profissionalismo que me impressiona até hoje. A gente está crescendo muito junto. Ninguém está pronto ainda. Eu não estou pronto como diretor e apresentador. Os meninos ainda têm muito a aprender e adquirir. Mas nesse ano, aprendemos muito e estamos formando uma família. Espero que a gente produza muito porque a gente está investindo em nós mesmos, construindo a nossa história.
Você pode deixar um recado para a galera negra das comunidades e quilombos?Tem uma lei que nos protege e sempre que a gente se sentir menosprezado tem que fazer uso dela. Mas acho que tem uma postura perante a vida, que vem da minha família, que fez muita diferença para mim. E aí falo isso para os pais. Tem que dizer o tempo todo que seu filho é bonito, inteligente, é capaz. Isso eu ouvia todo dia lá em casa. Tem que estimular sua criança. Nós jovens temos que ter consciência de que temos direitos. Temos que andar de cabeça erguida, ocupar todos os espaços. Eu não acredito em gueto, acho que a gente tem que estar em todo canto, não só na favela. Eu nasci em bairro humilde, mas ando tanto em lugares humildes quanto no Leblon, porque todos os lugares me pertencem. A gente tem que se sentir donos do mundo, como somos. E temos que nos unir.
Quais são os seus planos futuros?Continuar com a minha turminha do programa Espelho. Quero dirigir um longa-metragem, estou batalhando para isso. Quero, na verdade, ser empreendedor. Estou querendo contar as minhas histórias também, e não só me apaixonar pelas histórias dos outros e contá-las, quero propor histórias.


quinta-feira, 4 de outubro de 2007

O que fica dos Jogos Pan-americanos



Silas Barbosa, 20 anos, da Comunidade da Maré (fotos: Vivian Ragazzi) - PAPOPAN* / Agência ViraJovem de Notícias - 17/08/2007 - 9h00 - O repórter Silas Barbosa aproveitou a cerimônia sobre o legado social do Pan, no dia 14 de agosto, e entrevistou os jovens do projeto Guias Cívicos sobre o que os jogos Pan-americanos significaram para elas e eles। Confira!






O que o Pan, e agora o Parapan, representaram para você?


Foi muito gratificante para o Rio de Janeiro। O Pan trouxe várias oportunidades de emprego para nossa cidade, e também reestruturou muitos lugares, até mesmo com a criação do "Engenhão" (Estádio João Havelange). Foi bem bacana até para nossa comunidade. Nós tivemos a oportunidade de aprender uma outra língua, o espanhol, noções de ética e cidadania, e também de pudermos conhecer os lugares do Rio de Janeiro que mesmo morando a gente não tinha oportunidade de conhecer. Acho que vai acrescentar bastante.

Samira Carvalho de Andrade, 18 anos, ensino médio completo

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Parapan-Americano

Lars Grael: “Atletas do Parapan representam Brasil mais justo”

Silas Barbosa, 20 anos, da Comunidade da Maré (fotos: Vivian Ragazzi) - PAPOPAN* / Agência ViraJovem de Notícias -


15/08/2007 - 10h00 - O repórter do PAPOPAN Parapan Silas Barbosa, de 20 anos, da comunidade da Maré, teve a oportunidade de entrevistar o velejador Lars Grael no evento realizado na ONG Ação da Cidadania na manhã de 14 de agosto. O atleta, que mantém com os também campeões olímpicos do esporte Torben Grael e Marcelo Ferreira a ONG Rumo Náutico (http://www.rumonautico.org.br/), concedeu a seguinte entrevista:



SILAS BARBOSA: Como o esporte pode melhorar a auto-estima das pessoas com deficiência?



Lars Grael: Eu acho que o esporte prova para toda a sociedade que essa letrinha "d" que antecede a palavra deficiência pode ser um pré-conceito do próprio deficiente e da sociedade, sobretudo. Então, através do esporte, a pessoa com deficiência tem a capacidade de mostrar a superação, a volta por cima, a eficiência física e mostrar que ele também pode ser eficiente pro trabalho, podendo requerer os seus direitos como cidadão no mercado de emprego, para que possa ingressar na classe produtiva do país. Então o esporte tem um tema, uma conotação muito importante da volta por cima, e nós percebemos aí heróis as vezes anônimos do Brasil que mostram a sua capacidade por meio do esporte.





SILAS BARBOSA: Como os pais e a escola podem ajudar as crianças e os jovens com deficiência a praticar esportes?



Lars Grael: A escola é o berço de formação de todo e qualquer cidadão. Por isso, elas precisam estar dotadas de acessibilidade e de profissionais que possam fazer a inclusão da pessoa com deficiência, para que ela tenha acesso básico à educação com os mesmos direitos, mas com atenção especial, assim como à prática do esporte e da cultura.

A educação é a base de tudo, e promove a inclusão da pessoa com deficiência, dando oportunidade ao lazer, à prática esportiva, à cultura e ao mercado de emprego e trabalho a esse grupo grande de brasileiros.

SILAS BARBOSA: O que você diria para os atletas do Parapan?

Lars Grael: São heróis nacionais por estarem representando o Brasil nos jogos Parapan-americanos. Ás vezes são heróis que não têm o mesmo reconhecimento, apesar de estarem suando a mesma camisa, dignificando a mesma bandeira, superando os mesmos preconceitos com que eles sofrem por terem deficiências. Isso é um exemplo de superação e nós temos um orgulho muito grande, porque eles representam o espírito de um Brasil que quer dar certo, de um Brasil mais justo.